quarta-feira, 6 de março de 2013

ESCOLA PRIVADA NÃO É SINÔNIMO DE QUALIDADE, ALERTAM ESPECIALISTAS




Diferença no desempenho entre as escolas públicas e privadas está muito mais na bagagem dos alunos do que na qualidade do ensino

Fonte: Terra


O número de matrículas na educação básica no Brasil diminuiu nos últimos 10 anos. Em 2002, eram 54,7 milhões, contra 50,9 milhões em 2011. O ensino privado, por sua vez, seguiu uma lógica contrária e ampliou a quantidade de alunos no mesmo período - as inscrições nessas instituições passaram de 6,8 milhões para 7,9 milhões. Mas, mesmo com o aumento nas turmas, os pais devem estar atentos e serem criteriosos na hora da escolha. A diretora executiva do movimento Todos pela Educação, Priscila Cruz, alerta que escola privada não é sinônimo de ensino de qualidade.

Embora uma parcela da população possa ter como lema "se é pago, é bom", Priscila avalia que o conhecimento agregado tanto por instituições públicas quanto por particulares é o mesmo. A diferença está na bagagem cultural e no contexto socioeconômico de cada aluno.

A professora de pedagogia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Maria Marcia Malavasi diz que os frequentadores de uma escola privada geralmente têm mais acesso a livros e programas culturais, como ida a museus, teatros e cinemas. "As escolas particulares recebem os melhores alunos, com mais oportunidades", analisa.

Com isso, eles chegam com um acúmulo de conhecimento superior ao dos alunos de escola pública e, consequentemente, criam um capital cultural maior. Mas isso não significa que a privada seja melhor, pelo contrário. Sem o fator socioeconômico, Priscila afirma que o resultado de ambas seria equivalente, e a transferência de uma escola pública para uma privada é o mesmo que trocar seis por meia dúzia. "Há uma falsa percepção de que escolas particulares são mais eficientes", explica a diretora.

Nem o desempenho inferior das públicas na medição do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) deve ser encarado como uma informação final e absoluta. No ano passado, a divulgação do Ideb 2011 mostrou que as escolas privadas atingiram índice de 6.5 nos anos iniciais do fundamental, 6.0 nos anos finais e 5.7 no ensino médio, enquanto as públicas ficaram com 4.7, 3.9 e 3.4 respectivamente (segundo as médias de todo o País). Priscila frisa a importância de relativizar o desempenho das instituições.

Em um exercício de imaginação, a diretora do movimento Todos pela Educação sugere que os alunos, preservando suas condições socioeconômicas, fossem trocados de escola. A transferência colocaria os menos favorecidos em instituições particulares, enquanto crianças e adolescentes com maior contato com cultura e educação diariamente estudariam em colégios públicos. Nesse cenário, o melhor Ideb acompanharia a inversão, e a pior nota apontaria para as particulares.



Particulares estão abaixo da meta do Ideb

Ao analisar a evolução das escolas particulares no Ideb, é possível perceber ainda que essas instituições, conforme a média brasileira, foram as únicas que não atingiram a meta projetada para 2011. Todas as outras chegaram ao objetivo estabelecido, em alguns casos inclusive antecipando a meta de 2013. O quadro pode ser analisado de duas maneiras. Por um lado, quanto melhor é o desempenho de uma escola no Ideb, mais ele tende à estabilidade.

Priscila explica que cada ponto é um avanço bastante sensível, mas a evolução em cima do que já foi conquistado se torna mais lenta. "Por terem resultados maiores, fica cada vez mais difícil subir na pontuação e atingir metas que são crescentes. Não é desejável, mas é de se esperar que elas não estejam cumprindo as metas", afirma.

Por outro lado, a professora Marcia aponta que, mesmo com um índice alto, essas instituições têm um rendimento inferior a escolas de outros países. "O Brasil é subdesenvolvido em termos de educação. Não há qualidade de ensino e de vida. Tem poucos museus e bibliotecas, e as crianças não têm hábito de leitura", avalia.

Outro mito em relação às escolas particulares é o de que os educadores têm melhor instrução. "Os professores são formados pelas mesmas instituições", assegura Priscila. A diretora do movimento ressalta que o problema da formação inicial, com qualidade aquém do esperado, se estende tanto para profissionais de instituições públicas quanto privadas. Além disso, a questão depende também do desempenho individual. "Não podemos dizer que todos os professores são bons ou ruins", alerta Marcia.

A professora aponta ainda que a educação privada também carece de investimentos em projetos pedagógicos - bons modelos não são uma regra nessa área, opina Marcia. A vantagem dos colégios pagos está na facilidade de gestão. Diretores podem oferecer uma remuneração mais atrativa, além de bonificações ou financiamentos para cursos de especialização.


Desempenho depende mais do aluno do que da escola

Não é só pela qualidade que os pais costumam procurar escolas particulares. Eles estão de olho na segurança dos filhos - uma questão que, de fato, procede, na visão de Priscila - e, por que não, no status social que isso confere. Mas, em termos de educação, eles precisam ter em mente que a matrícula em uma escola privada não garante uma boa média no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) ou uma aprovação em vestibular. Mesmo que a instituição tenha uma boa avaliação de qualidade, a dispersão de resultados dentro de uma mesma escola é alta, com alunos excelentes e outros com desempenho menor. "Depende do esforço de cada um", ressalva Priscila.

O esforço individual é o que faz com que bolsistas de baixa renda, por exemplo, se beneficiem do ensino privado, segundo o que a diretora do movimento Todos pelo Educação cita como efeito dos pares: apesar do baixo repertório cultural, o estudante consegue ir bem nas aulas pela influência do conhecimento dos demais. "Quando alunos em peso têm esse repertório baixo, é mais difícil", detalha. A professora Marcia, por sua vez, é mais cautelosa. Para ela, quando uma escola recebe um aluno com um índice socioeconômico menor, a tendência é que o trabalho realizado obtenha resultados lentamente.

Na hora de matricular os filhos em uma instituição privada, os pais precisam estar atentos ao uso que as escolas fazem das notas obtidas em exames e vestibulares. Mas, assim como isso pode ser uma credencial de qualidade, também pode ser uma propaganda enganosa. A avaliação dos pais deve ocorrer, destaca Priscila, pelo que a escola pode oferecer para o crescimento daquele estudante, sabendo que certas instituições podem ser caras e ter qualidade duvidosa - muitas vezes, até mesmo com um ensino mais pobre do que as públicas.


Escolas públicas apostam na família para melhorar desempenho

O envolvimento dos pais nas atividades educativas dos filhos foi a fórmula encontrada pela Escola Municipal Beatriz Rodrigues da Silva, de Palmas (TO), para melhorar o desempenho no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) - que saltou de 4,7 em 2007 para 8 em 2011. A instituição faz parte do estudo Excelência com Equidade, desenvolvido pela Fundação Lemman e pelo Itaú BBA para traçar um panorama de escolas públicas que atendem alunos de baixo nível socioeconômico e que apresentaram bom desempenho nas avaliações.

Entre os casos analisados, o coordenador de projetos da Fundação Lemann, Ernesto Martins Faria, um dos responsáveis pela pesquisa, destaca o comprometimento das equipes envolvidas. "Algumas estratégias implantadas, como o acompanhamento contínuo das secretarias de educação, poderiam causar desconforto nos professores, que talvez se sentissem invadidos. Conseguir alcançar uma mudança cultural é um dos grandes desafios", diz.

Entre as práticas que ajudam as escolas a alcançar bons resultados, o estudo indica quatro estratégias em comum nas instituições analisadas: criar um fluxo aberto e transparente de comunicação; ganhar o apoio de atores de fora da escola, como entidades e poder público; enfrentar resistências com o apoio de grupos comprometidos e respeitar a experiência do professor e apoiá-lo em seu trabalho. "São práticas simples, mas que exigem engajamento de toda a equipe", afirma.

A diretora da escola Beatriz Silva, Fátima Pereira de Sena e Silva, também destaca o trabalho em equipe. Segundo ela, a presença da família foi decisivo. "Nós queremos que a comunidade se envolva com a escola, que participe da Festa da Família, do Festival da Primavera. Esse é um trabalho de parceria com as famílias", diz. Dar atenção total aos alunos foi outra estratégia traçada para atingir notas mais altas no Ideb. "Se o aluno não vem, ligamos para a família. O uso do uniforme é muito cobrado, não permitimos que eles tragam celular para a escola. Nossa evasão é zero", destaca. Para 2013, a instituição tem 880 alunos matriculados do ensino fundamental.

Para receber mais turmas, a escola de Palmas deve adaptar duas salas que até então eram utilizadas no projeto Mais Educação, do Ministério da Educação (MEC), que prevê a realização de atividades no contraturno. "Queremos atender mais a comunidade. Temos que nos adaptar para isso. Seria mais cômodo continuarmos como estávamos, mas a ideia é servir quem está ao nosso redor. É em nome do bem do grupo", explica.

Entre outras justificativas para a boa qualidade do ensino, a diretora aponta as reformas na escola, além da capacitação e valorização dos professores. "É uma questão de motivação, de mostrar que, se nós começarmos com o pé direito, vai ser mais fácil e vamos ser reconhecidos", diz.


Valorização financeira de professores refletiu no desempenho

Traçar uma meta foi o ponto de partida para a equipe da Escola Municipal Professora Suzana Moraes Balen, em Foz do Iguaçu (PR). Com Ideb 5,8, em 2009, a ideia era chegar a 7,5 - e, para isso, o trabalho da comunidade e da Secretaria de Educação também ganhou destaque. "Tivemos constante apoio não apenas com material físico, mas também pedagógico. Toda a nossa equipe se envolveu para atingir essa meta", diz.

O projeto fez parte de uma proposta lançada pela prefeitura do município: profissionais de educação de escolas que conseguissem elevar em ao menos 25% o Ideb receberiam um 14º salário. "A parte financeira não foi o único estímulo. Nós realmente queríamos alcançar uma qualidade de ensino melhor, e antes não tínhamos motivação para isso. Nosso prédio era defasado, assim como o quadro de professores. A partir do momento em que fomos valorizados, começamos a trabalhar melhor", diz.

Aumentar a carga horária foi outra alternativa - inicialmente mal vista pelos pais. Os alunos de 5º ano, que realizam a prova, passaram a ter aulas também no turno da tarde. "As famílias não gostavam muito, achavam que os filhos deveriam ficar em casa. Mas, com o tempo, mostramos a importância desse reforço", conta. Hoje, a turma do 5º ano tem aulas com o mesmo professor nos dois turnos, enquanto os demais anos revisam conteúdo e realizam exercícios em contraturno durante quatro horas, duas vezes por semana, com professor cedido pela prefeitura especialmente para a tarefa.

Nos horários em que o professor do 5º ano tem reservados para planejamento, um substituto entra em sala de aula para atividades como a oficina do dicionário, em que, a partir de crônicas, músicas e textos literários, os alunos aprendem a utilizar a ferramenta para expandir o vocabulário. A diretora destaca que a adesão para atingir a meta foi total. "Cada um percebeu o seu compromisso dentro da escola. Foi um passo muito grande tanto para os alunos, quanto para os professores. Agora, nós queremos crescer ainda mais", diz.







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